Sergio Meloni
Instituto São Clemente I Papa e Mártir
Os Milagres Eucarísticos no Mundo
Edições São Clemente
Título Original:
I Miracoli Eucaristici nel Mondo
Tradução: Lícia Pereira de Oliveira
Apresentação
OS MILAGRES EUCARÍSTICOS: LIMITES E ASPECTOS POSITIVOS
Apresento, primeiramente, os limites dos Milagres Eucarísticos e depois o valor
dos seus aspectos positivos.
1. Limites
- A nossa fé não é fundamentada sobre os Milagres Eucarísticos,
mas sobre o anúncio de Cristo Senhor, acolhido pela Fé graças à ação do Espírito
Santo.
Cremos porque acreditamos na pregação (cfr. Gl 3,5): Fides ex auditu autem
per verbum Christi (Rm 10,17): Pois a fé vem da pregação e a pregação
é pela palavra de Cristo. Crer é um ato da inteligência que, sob o estímulo
da vontade movida por Deus através da Graça, dá o próprio consentimento à verdade
divina (S. TOMÁS, Summa Theologiae, II-II, q.2,a.9,c).
E o centro da nossa fé na Eucaristia é Cristo, quem durante a sua pregação anunciou
a instituição da Eucaristia e depois a instituiu celebrando, na Quinta-feira
Santa, a Santa Ceia com os seus apóstolos.
Desde então a Igreja, fiél ao mandamento do Senhor: fazei isto em memória de
mim (1 Cor 11,24) celebrou sempre a Eucaristia com fé e devoção, principalmente
no Domingo, dia da Ressurreição de Jesus e continuará a fazê-lo até que Ele
venha (1 Cor 11,26).
- Não existe a obrigação, para o cristão, de acreditar nos
Milagres Eucarísticos. Eles não são obrigatórios para a fé dos fiés,
por mais que sejam reconhecidos oficialmente pela Igreja. Cada fiél conserva
a sua liberdade de escolha: nenhum cristão é obrigado a acreditar nas revelações
privadas, nem mesmo quando são aprovadas pela Igreja.
- Mas, como um princípio geral, o fiél não deve
excluir que Deus possa intervir extraordinariamente em qualquer momento, lugar,
acontecimento ou pessoa. Difícil é discernir se num determinado caso se verificou
ou não uma autêntica e extraordinária intervenção Divina.
- É perfeitamente justo que a Igreja seja prudente,
diante dos fenômenos extraordinários (como os Milagres Eucarísticos), pois,
entre outras coisas, existem os seguintes riscos:
Ainda que ninguém seja
obrigado a acreditar nele, o fiél deve demonstrar respeito pelo Milagre Eucarístico,
cuja autenticidade foi reconhecida pela Igreja.
2. Aspectos Positivos
Os Milagres Eucarísticos podem ser frutíferos para a nossa Fé. Podem,
por exemplo:
- Ajudar a ir além do visível e do sensível e
a admitir a existência de um Além, de um outro mundo.
por isso que o Milagre Eucarístico é considerado como
um evento extraordinário, pois não se explica com fatos e razões científicas;
ultrapassa a razão humana e interpela o homem solicitando que ele caminhe além
do sensível, do visível, do meramente humano, isto é, pede que ele admita a
existência de algo que é incompreensível, que não se explica somente pela inteligência
humana e que não é cientificamente comprovável.
- Ser uma ocasião para falar,
particularmente na catequese, sobre a Revelação Pública e a sua importância
para a Igreja e para o cristão. Os Milagres Eucarísticos são eventos
extraordinários ocorridos depois da instituição da Eucaristia, ao final do Novo
Testamento, quer dizer ao final da Revelação Pública.
O que é a Revelação Pública?
A Revelação Pública é:
- realizada progressivamente por Deus a partir de Abraão, passando pelos Profetas,
até chegar a Jesus Cristo;
- testemunhada nas duas partes da Bíblia: no Antigo e no Novo Testamento;
- destinada a todos os homens e ao homem por inteiro, de todos os tempos e lugares;
- radicalmente diferente, por essência e não somente por grau, das chamadas
revelações privadas;
- concluída com Cristo no Novo Testamento, com o qual a Igreja é vinculada.
Por que a Revelação Pública se concluiu com Cristo?
Porque Cristo é o Mediador e a Plenitude da Revelação.
Ele, sendo o Único Filho de Deus feito homem, é a Palavra perfeita e definitiva
do Pai. Com o envio do Filho e o dom do Espírito, a Revelação está agora plenamente
realizada, ainda que a fé da Igreja tenha de captar gradualmente todo seu alcance
ao longo dos séculos. (COMPÊNDIO 9)
Muitas vezes e de modos diversos falou Deus, outrora, aos Pais pelos profetas;
agora, nestes dias que são os últimos, falou-nos poor meio do Filho (Hb 1,
1-2).
Cristo, o Filho de Deus feito homem é portanto a única Palavra, perfeita e definitiva
do Pai, quem nEle diz e doa tudo e não existirá outra Palavra que essa.
Desde o momento em que nos deu o Seu Filho, que é a Sua única e definitiva
Palavra, Deus nos disse tudo de uma só vez nessa Palavra e não tem mais nada
a dizer (São João da Cruz). Portanto, a economia cristã, como nova e definitiva aliança, jamais
passará, e não se há-de esperar nenhuma outra revelação pública antes da gloriosa
manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo (cfr. 1 Tim. 6,14; Tit. 2,13). (VATICANO
II, Const. Dogm. Dei Verbum, 4)
Quais são as conseqüências dessas conclusões sobre a Revelação Pública?
Eis algumas:
- O Deus dos cristãos é crível e confiável e nos fundamentamos na Escritura
e não em mensagens reveladas posteriormente a pessoas particulares.
- Não temos que esperar de Deus nenhuma outra nova manifestação ou revelação,
somente o regresso glorioso de Cristo, que inaugurará novos céus e nova terra
(1 Pe 3,13), possibilitando que Deus Pai seja tudo em todos (1 Cor 15,28).
- A Igreja está vinculada ao evento único da História Sagrada e à palavra da
Bíblia e a sua missão é garantir, interpretar, aprofundar e testemuhar a Revelação
Pública. E isso acontece graças à particular assistência do Espírito Santo
que guia e conduz a Igreja para que ela conheça cada vez melhor o seu tesouro:
Cristo, o Senhor.
- A Revelação Pública exige a nossa Fé: de facto, nela, é
o próprio Deus que nos fala por meio de palavras humanas e da mediação da comunidade
viva da Igreja. A fé em Deus e na sua Palavra é distinta de qualquer outra fé,
crença, opinião humana. A certeza de que é Deus que fala, cria em mim a segurança
de encontrar a própria verdade; uma certeza assim não se pode verificar em mais
nenhuma forma humana de conhecimento. É sobre tal certeza que edifico a minha
vida e me entrego ao morrer. (CONGREGAÇÃO
PARA A DOUTRINA DA FÉ, A Mensagem de Fátima)
- Porém, ainda que a Revelação seja completa, não é totalmente explícita, a Fé
cristã deve conhecê-la melhor, aprofundar cada vez mais no seu conteúdo, encarná-la
sempre na vida e testemunhá-la a todos com fidelidade e coragem. Só é possível acolher
todo o seu alcance, gradualmente, no decorrer dos séculos.
- Os Milagres Eucarísticos podem ajudar a conhecer e a viver
a Fé, cujo centro é Cristo, Cristo-Eucaristia: são
realmente úteis porque estão intimamente orientados a Cristo e não são autônomos,
podem revigorar a fé subjetiva dos fiéis e até dos que não crêem. São uma ajuda
para a fé porque nos orietam à Eucaristia instituída por Cristo e celebrada
na Igreja todos os domingos. Eles estão à serviço da Fé; não devem e nem podem
acrescentar nada ao único e definitivo dom de Cristo-Eucaristia, mas podem chegar
a ser uma humilde chamada de atenção. Podem ser, algumas vezes, proveitosos
para aprofundar na fé, mas é uma ajuda que não existe a obrigação de aceitar.
- Os Milagres Eucarísticos convidam a conhecer, a apreciar
e a amar a Eucaristia.
Podem ajudar as pessoas a descobrirem o mistério, a beleza e a riqueza da Eucaristia,
como diz o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, aprovado e publicado no
mês de junho passado pelo Papa Bento XVI:
É fonte e ápice de toda a vida cristã. Na Eucaristia, atingem o seu
clímax a ação santificante de Deus para conosco e o nosso culto para com ele.
Ela encerra todo o bem espiritual da Igreja: o mesmo Cristo, nossa Páscoa. A
comunhão da vida divina e a unidade do Povo de Deus são expressas e realizadas
pela Eucaristia. Mediante a celebração eucarística, já nos unimos à liturgia
do Céu e antecipamos a vida eterna. (274).
- Não podemos esquecer nunca, nem deixar de falar que a Eucaristia é o verdadeiro
e grande inesgotável Milagre quotidiano. Ela:
- É um Sacramento: Os
sacramentos são sinais sensíveis e eficazes da graça, instituídos por Cristo
e confiados à Igreja, por meio dos quais nos é concedida a vida divina (
)
são eficazes ex opere operato ("pelo fato mesmo de a ação sacramental
se realizar"), porque é Cristo que age neles e que comunica a graça que
significam, independentemente da santidade pessoal do ministro; todavia os frutos
dos sacramentos dependem também das disposições de quem os recebe. (COMPÊNDIO
do CCC, 224.229)
- É o Sacramento Domenical por exelência: é evidente
que o Milagre mais difundido e ao alcance de todos é o que ocorre nas nossas
igrejas todas as vezes que se celebra a Santa Missa.
É o próprio sacrifício do Corpo e do Sangue do Senhor Jesus, que ele instituiu
para perpetuar pelos séculos, até seu retorno, o sacrifício da cruz, confiando
assim à sua Igreja o memorial de sua Morte e Ressurreição. É o sinal da unidade,
o vínculo da caridade, o banquete pascal, no qual se recebe Cristo, a alma é
coberta de graça e é dado o penhor da vida eterna. (COMPÊNDIO 271)
Sem sombra de dúvidas, o Milagre mais importante e estrondoso é o que ocorre
todas as vezes que se celebra a Eucaristia na qual Jesus
Cristo está presente na Eucaristia de modo único e incomparável. Está presente,
com efeito, de modo verdadeiro, real, substancial: com o seu Corpo e o seu Sangue,
com a sua Alma e a sua Divindade. Nela está, portanto, presente de modo sacramental,
ou seja, sob as espécies eucarísticas do pão e do vinho, Cristo todo inteiro:
Deus e homem. (COMPÊNDIO 282). Fazendo presente e atualizando
o seu Sacrifício da Cruz, com o Seu Corpo e o Seu Sangue, Ele se faz nossa comida
e bebida, unido-se a nós e vivendo entre nós se transforma em viático do nosso
peregrinar neste mundo caminho à patria eterna.
Este é o milagre misterioso por excelência, que somos convidados a celebrar
principalmente aos domingos, na comunidade eclesial, partindo o único pão, que
como afirma Santo Inácio de Antioquia nós
partimos o único pão que é remédio de imortalidade, antídoto para não morrer,
mas para viver em Jesus Cristo para sempre.
- É oportuno também valorizar os Santuários dos Milagres Eucarísticos,
reconhecidos pela Igreja como lugar de celebração litúrgica (particularmente
do Sacramento da Reconciliação), lugar de oração e de espiritualidade eucarística,
de catequese e de obra de caridade.
- Os Milagres Eucarísticos se manifestam relacionados com a piedade popular.
Eles, com freqüência, provêem da piedade popular e incidem sobre ela dando-lhe
novos impulsos e abrindo-lhe novas formas de manifestação. Isso não exclui
que eles tenham um efeito sobre a liturgia, como ocorreu, por exemplo, com
a instituição da Festa de Corpus Christi. A liturgia é o critério, ela é a
forma vital de toda a Igreja e é nutrida diretamente pelo Evangelho.
S.E. Rev. ma Mons Raffaello Martinelli
Reitor do Colégio Eclesiástico Internacional São Carlos
Oficial da Congregação para a Doutrina da Fé
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